30 março, 2009

A Cruz e seus Significados


É possível detectar a presença da cruz, seja de forma religiosa, mística ou esotérica, na história de povos distintos e distantes como os egípcios, celtas, persas, romanos, fenícios e índios americanos.

Seu modelo básico traz sempre a intersecção de dois eixos opostos, um vertical e outro horizontal, que representam lados diferentes como o Sol e a Lua, o masculino e o feminino e a vida e a morte, por exemplo.



É a união dessas forças antagônicas que exprime um dos principais significado da cruz, que é o do choque de universos diferentes e seu crescimento a partir de então, traduzindo-a como um símbolo de expansão.

De acordo com o estudioso Cirlot, ao situar-se no centro místico do cosmos, a cruz assume o papel de ponte através da qual a alma pode chegar a deus. Dessa maneira, ela liga o mundo celestial ao terreno através da experiência da crucificação, onde as vivencias opostas encontram um ponto de intersecção e atingem a iluminação.

A cruz possui assim, como todo símbolo, múltiplos sentidos; mas a intenção não é de desenvolver todos aqui, e sim apenas alguns.

Para voltarmos ao simbolismo da cruz, diremos que ela tem vários sentidos, mais ou menos secundários e contingentes e é natural que seja assim, dada a pluralidade de sentidos que cabem em qualquer símbolo.

A cruz, pode ser encontrada em um número muito grande de variações, porém o modelo básico é sempre a interseção de dois segmentos retos, quase sempre na vertical e horizontal.

O significado do símbolo da cruz é sempre a conjunção dos opostos:


o eixo vertical (masculino) e o eixo horizontal (feminino);
o positivo e o negativo;
o homem e a mulher; o superior com o inferior; o tempo com o espaço;
o ativo com o passivo; o Sol com a Lua;
a vida com a morte,
etc., pois tudo no universo (e no homem) nasce e se desenvolve a partir do choque doloroso de forças antagônicas.





A cruz afirma assim a relação básica entre o espiritual e o terreno, e que é, através da crucificação (o conhecimento dos opostos), que se chega ao centro de si mesmo (a iluminação).






Leia a matéria completa e conheça seus significados AQUI!

27 março, 2009

Panteões Brasileiros

São várias as entidades adoradas por nossos índios, e são úteis para os que seguem a magia tradicional e preferem uma regionalização, segue abaixo algumas lendas:

ALAMOA - duende feminino da Ilha de Fernando de Noronha.
Mora no Pico e vaga pelas suas redondezas, observando tudo que acontece na ilha. Segundo o mito, às sextas-feiras a pedra do Pico se fende e ela aparece na forma de uma forte luz ou um fogo-fátuo. Protetora da vida silvestre, ela aparece para os pescadores exagerados e os caçadores por esporte na forma de uma mulher linda e nua, mas quando eles se aproximam, transforma-se em um esqueleto, enlouquecendo-os.

Pedra do Pico

Os antigos detentos do presídio da ilha de Fernando de Noronha contavam que nas vésperas de tempestades, quase sempre à meia-noite, aparecia na praia uma mulher lindíssima, muito alta, com longos cabelos louros e completamente nua, dançando ao som do bater das ondas, iluminada pelos relâmpagos. Seus pés pareciam não tocar no chão e sim flutuar na areia. Era a alamoa, feminino de alamão (alemão), pois conforme a interpretação popular, mulher loura naquelas paragens só poderia ser alemã.
Sua forma varia.
Algumas vezes ela é uma forma luminosa, multicolorida, outras vezes, atrai os homens e os seduz. Aqueles que sucumbem a seus encantos vêem-na se transformar em um esqueleto. Para alguns, é uma alma penada, à procura de um homem forte que a ajude a desenterrar um tesouro escondido.
A pedra do Pico é a sua morada. Em algumas noites, a pedra se fende, abrindo-se uma porta, por onde sai uma luz. A bela alamoa baila, atraindo sua vítima. Aqueles que entram em sua morada, logo constatam com horror a terrível transformação. Seus belos e brilhantes olhos transformam-se em dois buracos e ela vira uma caveira horripilante. Então, a fenda se fecha e o pobre homem nunca mais é visto. Seus gritos de pavor, no entanto, ainda ressoam no local durante muitos dias.
É caracterizada como uma convergência de várias lendas de sereias e iaras. O tema da mulher sobrenatural que atrai e seduz os homens, transformando-se a seguir, é comum e recorrente no imaginário popular, sendo, por isso, impossível determinar sua origem com precisão.

Amanha_manha

AMANA-MANHA - Deusa-Mãe da Chuva e protetora das nascentes. Tem a forma de uma rã e pode-se ouvi-la cantar quando chove. Mora na cabeceira do Rio Negro.

Amao

AMAO - Espírito do Rio Negro. Ensinou os indígenas Camanaos o processo de fazer beiju, farinha de mandioca, farinha de tapioca e várias outras coisas.
Personagem divina que ensinou aos indígenas camanaos, do rio Negro, Amazonas, o processo de fazer beiju, farinha de mandioca, farinha de tapioca e várias outras coisas. Depois desapareceu para sempre.
Brandão de Amorim ouviu a lenda:
“No princípio do mundo, contam, apareceu entre outras criaturas uma moça bonita. Não sabia de homem, seu nome era Amao. Uma tarde Amao foi para a beira do rio, aí se sentou. No mesmo momento passou por junto dela porção de peixe, a pele deles, contam, brilhava de verdade. Ela meteu a mão no rio, pegou um peixe. O peixe fez-se forte na mão dela, pulou direto na sua concha, furou-a, depois tornou a saltar para o rio. Desde aí sua barbinha foi crescendo, quando chegou madureza de sua lua, ela teve um menino.
A criança já tinha duas luas, quando a mãe dele foi pescar de puçá peixinho na cabeça da correnteza. O menino ela deixou deitado em cima da pedra. Já era meio-dia, Amao saiu, foi ver o menino, encontrou-o já morto.
Carregou seu corpo que foi, chorou durante a noite; quando o sol apareceu, o menino falou deste modo:
Minha mãe repara como os animais e pássaros estão rindo de nós. Eles mesmos me espantaram para eu morrer. Agora, para eles não escarnecerem de ti, defuma-os com resina para virarem pedra. Assim somente ele falou.
Já com à tarde, Amao enterrou seu filho, à meia-noite virou pedra todos os animais. De manhã, contam, cururu, cujubim, pássaro-pajé, lontra, estavam já de pedra. Cobra-grande, raia, taiaçu, tapir somente não viraram de pedra porque foram comer para a cabeceira. Amao voou logo para a cabeceira, passou em cima duma pedra grande, aí encontrou taiaçu e tapir dormindo. Amao surrou primeiro no tapir, depois surrou no taiaçu, morreram ambos. Depois retalhou o tapir, o taiaçu, jogou carne deles no rio, deixou somente uma coxa de tapir, outra do taiaçu em cima da pedra; aí as virou pedra. Como cobra-grande e raia ainda estavam comendo no fundo d’água, ela fez um laço na beira do rio para agarrá-las. Já noite grande ouviu uma coisa batendo no laço, foi ver, encontrou a cobra-grande com a raia. Jogou nelas com resina, viraram de pedra imediatamente.
Depois voltou para ensinar todos os trabalhos à gente da terra dela.
Sentou um forno, mostrou como a gente faz beiju, farinha, farinha de tapioca, porção de coisas. Depois de ensinar tudo, Amao sumiu-se desta terra, ninguém sabe para onde!”

TXUNÔ - Deusa Caxinauá com forma de andorinha. Leva os mortos para junto de seus antepassados.
Entre os indígenas caxinauás, de raça pano, no Acre, há uma lenda da txunô, andorinha, conhecida literalmente em todo o Brasil.
“Um menino, ba-kö, divertia-se na roça, perseguindo uma andorinha e conseguiu agarrá-la. A txunô disse que não a matasse que ela o levaria para o céu onde viviam todos os antepassados do menino. O ba-kö aceitou, e a andorinha mandou-o segurar-se às suas penas e subiu. Entrou para o céu, encontrando o irmão de seu pai, sobrinhos, amigos.
Contou sua história a um tio e este lhe mostrou legumes, casas bonitas e o chão coberto de areia branca e fina. Lá de cima vêem tudo. O tio do menino fez comida e o ba-kö comeu e satisfez-se. E ficou vivendo no céu.

ANGOERA - Espírito dos Pampas, tem a forma de uma língua de fogo e vagueia pelos pampas protegendo a vida silvestre.

ANHANGA - Deus da Caça no campo; protege os animais terrestres contra os caçadores que querem abusar da caça, matando desnecessariamente.
Pode assumir formas diversas e, por isso, também tem vários nomes:
Mira-nhanga = espírito de humano;
tatu-anhanga = espírito de tatu;
suaçu-anhanga = espírito de veado;
tapira-anhanga = espírito de boi.
Segundo os mitos tupis, a visão de um anhangá é prenúncio de alguma desgraça para os caçadores; no mínimo, um aviso de que estão exagerando e devem sair da mata. Também protege as plantas, das quais os animais dependem.

ARAÇI - Deusa-Mãe do dia. Tem a forma de uma cigarra. Também chamada de Aramanha ou Daridari. Na mais longínqua e remota antiguidade, Itaquê, o mortal, amou a imortal Deusa Lua Jaci.
Dessa união, nasceu Araci, que ao morrer, foi elevada aos céus por sua mãe, tornando-se a ninfa das manhãs e da aurora.



ARU - Filho de Amana-Manha, também tem a forma de um sapo, que vive em clareiras do mato e em roçados. Em noites de chuva, Aru transforma-se em um rapaz e, pegando uma canoa, vai buscar sua Mãe na cabeceira do Rio Negro para visitar as roças e fazer com que elas prosperem.


BIATATÁ - Deusa do Mar, com forma de uma cobra-de-fogo aparece sobre a água apenas de noite.

BOITATÁ - Deus das águas doces, na forma de uma cobra-de-fogo. Vive nas praias de mar e de rio. Protege os campos contra incêndios. Às vezes se transforma num madeiro grosso em brasa, chamado méuan, para atacar aqueles que põem fogo nos campos inutilmente.
Também conhecido como "fogo que corre", o boitatá, no folclore brasileiro, é uma grande cobra de fogo.
No Norte e Nordeste, de acordo com a lenda, o boitatá protege as matas e florestas das pessoas que provocam queimadas. O boitatá vive dentro dos rios e lagos e sai de seu "habitat" para queimar as pessoas que praticam incêndios nas matas.
De acordo com esta lenda, o boitatá possui a capacidade de se transformar num tronco de fogo.

BOIÚNA - Deus das Matas, com a forma de uma grande cobra preta, de olhos luminosos. Às vezes assumem a forma de um vapor para vagar sobre as águas dos rios, lagos e igarapés.
Contam que uma moça ficou grávida escondeu a gravidez de seus familiares. No dia do parto, quando estava sentindo dores, disse aos pais que iria lavar roupa no Pirucaba (embaixo da ponte do Rio Itacaiúnas). Chegando lá, teve a criança e jogou-a no rio. A menina não morreu. Encantada, transformou-se numa cobra enorme. Após muito tempo uma cobra enorme, a Boiúna costumava aparecer aos pescadores em seus sonhos em forma de uma bela moça.
E ela contava a sua triste estória: Havia se transformado em uma cobra e que para desencantá-la era necessário que despejassem leite materno em sua boca e também deveriam cortar um pedaço de seu rabo e assim o encantamento terminaria. Mas ela nunca foi desencantada, pois quando algum pescador se propunha a tal façanha, vinha aquele banzeiro enorme ou mesmo quando viam a Boiúna, corriam com medo e nem se lembravam de que ao desencantar a Boiúna se tornariam ricos para o resto de suas vidas. E pescadores afirmam que na época da construção da Ponte do rio Tocantins ela também já aparecerá várias vezes. Dizem que até hoje a Boiúna mora no poção do inflamável.
Os índios não registram culto à cobra, mas ela não deixa de existir como personagem em suas narrativas lendárias. Para o caboclo, o encanto da Cobra Grande se manifesta na contemplação da natureza do rio, distanciada do cotidiano através do imaginário; é quando a Boiúna (mboi = cobra, una = preta) surge, causando medo, fascínio e influenciando as populações ribeirinhas, ora encarnada num grande barco iluminado, na lenda do navio transatlântico, ou através de inúmeras outras narrativas, como a da lenda que explica o surgimento da noite e outras coisas.
Segundo essa lenda, antes da noite existir, Moiaçu, filha da Cobra Grande, se casa e recebe do pai um caroço de tucumã (fruto da palmeira Astrocarium Tucuman) contendo a noite dentro dele. Outra lenda diz que uma linda índia cunhãmporanga, princesa da tribo, ao apaixonar-se pelo Rio Branco, foi transformada numa imensa cobra chamada Boiúna, pelo enciumado Muiraquitã.
A Boiúna é tida na região como protetora daquele rio, ajudando os pescadores e punindo aqueles que prendam suas águas.

CAAMANHA - Deusa-Mãe da Mata. Protetora dos vegetais e animais.
Coloca gravetos envenenados na cama ou rede dos lenhadores para que fiquem
entorpecidos e sejam comidos pelos animais. Ela que protege as florestas e os animais silvestres, e pune, portanto, os desmatamentos, as queimadas, e as violências contra a Natureza.

CAAPORA - Espírito da Floresta, também chamado de Caipora ou Curupira. Tem os pés virados para trás para que ninguém possa seguir seu rastro.
Mora em troncos de velhas árvores. Protetor da mata e dos animais. Tem cabelos arrepiados e verdes, olhos em brasa e, às vezes, cavalga um caititu (porco-do-mato) agitando um galho de japecanga. Tem o poder de ressuscitar os animais mortos sem sua permissão, apavorando os caçadores.
A lenda da Caipora é bastante evidenciada em todo o Brasil. Sua presença vem desde os indígenas, é deles que surgiu este mito. Segundo muitas tribos, principalmente as do Tronco Lingüístico Tupi-Guarani, a Caipora era um Deus que possuía como função e dom o Controle e Guarda das Florestas, e tudo que existia nela.Com o contato com outras civilizações não-indígenas, esta divindade foi bastante modificada quanto a sua interpretação, passando a ser vista como uma criatura maligna.
A Caipora apronta toda sorte de ciladas para o caçador, sobretudo aquele que abate animais além de suas necessidades. Afugenta as presas, espanca os cães farejadores, e desorienta o caçador simulando os ruídos dos animais da mata. Assobia, estala os galhos e assim dá falsas pistas fazendo com que ele se perca no meio do mato. Mas, de acordo com a crença popular. É, sobretudo nas sextas-feiras, nos domingos e dias santos, quando não se deve sair para a caça, que a sua atividade se intensifica. Mas há um meio de driblá-lo. A Caipora aprecia o fumo.
Assim, reza o costume que, antes de sair para caçar no mato, na noite de quinta-feira deve-se deixar fumo de corda no tronco de uma árvore e dizer: “Toma, Caipora, deixa-me ir embora”.
A boa sorte de um caçador é atribuída também aos presentes que ele oferece. Assim, por sua vez, os homens encontram um meio de conseguir seduzir a caipora.
Mas fracasso na empreitada é atribuído aos ardis da entidade.

CAPELOBO - Animal fantástico, com corpo humano, focinho de anta ou de tamanduá e pé em forma de um fundo de garrafa. Sai à noite para rondar os acampamentos e barracões, com gritos.
Também conhecido como cupelobo, este animal fantástico é fruto de uma crença que sobrevive a longo tempo nas regiões Norte e Nordeste do Brasil, sendo geralmente descrito como sendo uma criatura com corpo humano e focinho de anta, ou tamanduá. Sua forma costumeira de buscar comida é a caçada feita à noite, quando procura os acampamentos e barracões situados no interior dos estados do Maranhão e do Pará, região onde vive, em busca de cães e gatos recém-nascidos com os quais possa se alimentar.
A lenda garante que o capelobo não se intimida diante de um bicho maior que ele, pois sempre consegue dominá-lo com facilidade, para depois lhe cortar o pescoço e beber o seu sangue. Sua presença nas proximidades de qualquer moradia isolada pode ser percebida com facilidade até mesmo por pessoas menos observadoras, pois além de seus pés com formato de fundo de garrafa deixarem rastros perfeitamente reconhecíveis a um simples olhar, ele também costuma soltar um grito medonho que é diferente de todos os outros gritos conhecidos. Os índios o identificam como lobisomem que só pode ser morto com um tiro dado na região do seu umbigo.

Alguns folcloristas sustentam a versão de que os indígenas da região do Xingu acreditam na transformação de certos irmãos seus em capelobos, embora admitam que sobre esse processo de modificação não existem informações que possam esclarecê-lo de forma satisfatória. Um outro relato garante que nas regiões de mata do Maranhão, principalmente na do rio Pindaré, que nasce nos contrafortes da serra da Desordem, existe um bicho feio e feroz conhecido como cupelobo, o que é sustentado pela descrição de que um índio timbira que andara caçando por aquelas paragens chegara a ver um deles, ouvindo seu grito medonho e depois percebendo suas pegadas redondas nas trilhas da floresta.

De acordo com a lenda criada a respeito desse animal misterioso e estranho, ele tem corpo de homem, mas seu focinho é igual ao de um tamanduá por uma razão assustadora: ao encontrar alguém andando desprevenido pela selva, ele o abraça com seus braços fortes, perfura-lhe o crânio na parte mais alta, introduz a ponta de seu focinho nesse orifício e sorve gulosamente toda a massa encefálica do infeliz. Depois abandona no local o corpo da pobre vítima, para que outros animais possam se servir dele. Uma outra versão o apresenta com aparência que lembra a marmota em formato de gente, com mais ou menos dois metros de altura e somente um olho no meio da testa. Peludo e muito feio, tem o costume de perambular pelas várzeas, e não obstante o medo que inspira às pessoas, jamais se ouviu falar que causado mal a alguém.

O jornalista Pádua Carvalho, ao escrever sobre o assunto, cita que no Pará é conhecido pelo nome de ‘kumacanga’, e que tanto pode ser o sétimo filho varão, oriundo de conúbio sacrílego, quanto à concubina de padre. Pelas noites de sexta-feira, o corpo fica em casa, despojado da cabeça, a qual sai pelos ares, transformada em bola de fogo. Assim, o mito da curacanga do Maranhão é o mesmo que o do Pará, divergindo apenas no nome, quanto a uma consoante. Viriato Correia, num dos seus livros de contos, dá à ‘mula-sem-cabeça’ a apelação de ‘cavalacanga’, que ouviu entre os habitantes do interior maranhense.

Outra versão diz que a lenda é muito comum na região dos rios do Pará e Maranhão, e que o nome Capelobo é uma fusão da palavra indígena ‘cape”, que significa osso quebrado, torto ou aleijado, com lobo.
Segundo essa descrição, a criatura pode aparecer como uma anta de cabelos longos, de tamanho maior que as comuns, mais veloz que elas e com focinho semelhante ao de um cão ou porco.
Ou então com aparência de homem, mas com corpo arredondado e focinho de tamanduá.

CARUANAS - Espíritos das Águas, protetores da saúde dos que o invocam. São energias encantadas que regem as forças das matas amazônicas. Podem assumir forma humana ou animal são os guardiões dos mananciais.

CARUARA - Duende amazônico, com forma de bicho-de-pau. Protege seus invocadores contra feitiços, mau-olhado, quebranto e reumatismo… mas também pode causar tudo isso, se aborrecido.


CAVALO DO RIO - Protetor do Rio São Francisco, persegue os pescadores predatórios, afundando suas barcas. Quando anda pelas margens do rio,
ninguém o vê, mas ouvem seus passos. Em noite de Lua Cheia, reflete sua luz, tornando sua silhueta mais visível (porém, só na forma de um vulto).

CEUCI - Deusa-Mãe das Estrelas, mãe virgem de Jurupari. A origem desta lenda se dá do cerro das 7 estrelas ou plêiades, em que os naturais tupis indicavam o nome de variável de: Cincy, Cincê, Cucê. Com este ingênuo nome, Ceuci filha de Tupã e de Luaci.
Luaci que era conhecida como mãe do céu abaixo do sol, onde morava na espuma de uma nuvem e ao navegar no espaço aproveitava-se do sono desta menina caraíba para incorporar-se nela expulsando a alma, que desde então a seguiu como uma sombra impertinente, queria a todo transe voltar ao corpo e dormindo ela, esta selvagem menina recebeu o espírito divino, tornando-a assim a cunha aporanga e mais ladina da tribo, seus encantos no dia a dia aumentavam cada vez mais, adquirindo poder de amainar as feras e acalmar os ventos. Certo dia quando passeava pelo mato, uma lua antes de sua carimã (festa da puberdade das donzelas), deixou-se tentar por frutos maduros e sedosos de doçura que eram vedados aos desejos das impúberes, o sumo escorrendo-lhe pelos seus seios abaixo despertou a fecundação, os caraíbas ficaram revoltados, embora ela continuasse a garantir que era virgem e não fora visitada pelo “Yaciteiú”, mas o conselho da tribo e o alto da “Aharaigichi” exigiam que o conselho dos velhos se reunisse regido pelo Pajé-assú com a eminência de resolver o caso. Ceuci risonha e tranqüila resolveu aparecer, porém suspeitando da mácula gritasse na gravidez. E os maracás soaram no ar desfazendo os indícios e festejando a virgindade intacta. Porém, os maiorais para dar exemplos cunhãns desprevenidas, resolveram desenterrar Ceuci para elevadíssimas. Itacangas da cerra do “Cunakê”. E assim foi no exílio, sem culpa, castigada, mas inocente, Ceuci veio dar a luz a Jurupari, o reformador, o profeta, o silencioso, dos caiuras, inflexível como um juramento e eterno como símbolo. Aos 10 anos de idade já assombrava aos seus, pela força de argumentos e mostrando uma experiência e sabedoria, os mais valentes guerreiros da redondeza vinham ouvi-lo silenciosamente, pois ele revelava e ditava a lei da agricultura e foi espalhando as suas lições na montanha de Cunakê. Despeitado com Tupã, Anhangá não tardou pela curiosidade e aproximou-se da serra conduzindo em sua companhia a linda e bela Ceuci que foi arrastada pelo desejo de assistir a Poracé (festa) em honra de Jurupari, porém aconteceu que Anhangá empregando as suas artes tortuosas conseguiu induzir Ceuci transportando um terreno que não era permitido a curiosidade feminina. Desta forma violou o recinto privativo a mãe de Jurupari que condenava ao sacrifício certo.
Celebrando assim os Pagé-assús chamaram a noite do rito: Ceuci, Tieté, Unandú!
E um corpo de mulher caiu ao solo fulminando.

Mandaram então buscar Jurupari afim de ressuscitá-la, mas o nosso herói, inflexível não transgride a lei, mesmo que seja uma pessoa especial como Ceuci: “Morreste ó mãe, porque desobedeceste a lei de Tupã, esta lei que eu ensino, agora podes subir radiante, pura e bela aos braços de meu pai”.
O corpo de Ceuci enchendo-se de uma figuração estranha acendeu iluminado, atravessou o espaço e fez-se estrela e ela tornou-se a mais formosa das plêiades, transformou-se para exemplificar o respeito que devia inspirar aos selvagens, as leis dos Tupis.

Ceuci_Mãe dos Tupis, dos caraíbas e Anãmas, é uma deusa morta, porque nunca mais veio à terra, de grande prestígio na mitologia da América do Sul.
É ela quem do luaca, distribuiu a sorte às “Tainaetas” (enlevo dos lares das florestas).
Na astronomia das tribos sul-americanas, Ceuci também é conhecida por Ciucy e Celchu, chamada vulgarmente a Constelação das Plêiades.

CHIBAMBA - Espírito das Bananeiras ronca como um porco e gosta de dançar. Fantasma do ciclo das assombrações criadas para assustar crianças, para fazer parte dos seus pesadelos noturnos. É do sul de Minas Gerais. Amedronta as crianças que choram as teimosas e as malcriadas. Anda envolto em longa esteira de folhas de bananeira, ronca como se fosse um porco e dança de forma compassada enquanto caminha; às vezes gira.

O nome é um vocábulo africano, Bantu na verdade, e teria como significado uma espécie de canto ou dança africana à exemplo do Lundu (Espécie de dança nativa africana).
Na Ásia, entre os antepassados dos Laos, da Indochina francesa, chamados de Pu Nhiê, há uma dança. Os Pu Nhiê, em certa época, vestindo folhas e peles, surgem com máscaras de monstros excêntricos. E Dançam lentos, compassados, dando giros misteriosos, ao som de tambores.
A dança grave, em giro, é bem africana e de finalidade religiosa. As outras, coletivas, festivas, em ritmo mais agitado, são rituais de pesca e caça. O Chibamba é um remanescente dos rituais negros da África, que se transformou em Cuca, ou Negro Velho, e se tornou encarregado de fazer dormir à força as crianças. O fato de "roncar como um porco" é uma adaptação brasileira.
Chibamba, pelo nome e maior influência negra que indígena em Minas Gerais, é africano. Ali ele vive, fazendo as crianças dormirem, mesmo quando não estão com vontade.
Há uma quadrinha que diz: Êvém o Chibamba, neném, ele papa minino, cala a boca!...

O Chibamba vestido de folhas de bananeira e dançando lembra a África de onde o nome é originário. Em Angola e Congo ainda os negros, em suas tradições festivas e folclóricas, dançam vestindo elaboradas roupas feitas de folhas, ramos e galhinhos de plantas locais.

De fato, os nativos africanos se vestiam com folhas e usavam máscaras assustadoras nos seus rituais de pesca, caça e mesmo religiosos. Sua chegada ao Brasil mineiro, em seus terreiros festivos, onde as amas pretas de leite cuidavam dos seus bebês e também das crianças brancas, explica o surgimento do Chibamba como criatura assustadora.

Era uma oportunidade e tanto mostrar às crianças, aqueles figurantes caracterizados como monstros cobertos de folhas e mascarados, como uma entidade que viria atormentar crianças que não queriam dormir.

Na tradição africana, os figurantes cobertos de folhas e mascarados, simbolizavam a encarnação dos seus antepassados, que ora visitavam seus descendentes, para abençoar suas festas, caçadas, colheitas, guerras e mesmo rituais de casamento.

Também os nossos índios dançavam envoltos em folhas e tecidos vegetais. Não é uma tradição dos Tupis, mas entre os pajés do Brasil colônia. Estes dançavam, nas horas dos rituais religiosos, disfarçados, cobertos de folhas e pintados com corantes vegetais. A dança lenta, rodada, com os figurantes cobertos com vestimentas ornamentadas, era tradição entre os Gês, Nu-aruacos, e mesmo Caraíbas.

Mas a influência para a existência do Chibamba mineiro é mesmo africana.


COARACI - Deus-Sol (Tupi, Nheengatu e Guarani), criador de todos os viventes e deuses. É casado com Jaci, sua irmã, a Deusa-Lua.

COROACANGA - Espírito das Palmeiras. Tem a forma de uma bola de fogo azul faiscante.

GANHAMBORA - Espírito das Matas, também conhecido como Pai-do-Mato, com aparência semelhante ao Pã grego. É grande e peludo, com uma barbicha preta, andando sempre acompanhado por um bando de queixadas. Normalmente está enlameado. Sua urina é azul.

GUAJARA - duende dos manguezais. Duende invisível que habita os manguezais do Ceará. Chamam-no também guari e pajé do rio Açoita os cães sem a menor piedade. Aterroriza os viandantes com gritos aterrorizantes. Imitam vozes de animais, ruídos de caçador, pescador, colhedor de mel de abelhas, fingindo cortar árvores; às vezes assume a forma de um pato para poder entrar nas casas e fazer suas brincadeiras. O Guajará é uma espécie de fantasma travesso, aparece sempre rapidamente; ou mesmo nem aparece; apenas uma sombra. Aliás, dizem que ainda aparece. Segundo os pescadores se alguém sair para pescar no mangue e de repente ouvir barulhos estranhos, assobios, cantigas, som de machado cortando o mangue, bolas de fogo, etc., pode voltar que nesse dia não se pesca absolutamente nada e, se por acaso, alguém desobedecer as regras, além de não pescar nada o indivíduo volta pra casa com febre, cansado e com dores por todo o corpo, com se fosse açoitado pelos galhos de mangue que o Guajará carrega na mão.
Para fazer boas pescarias e não ser atormentado pelo Guajará é bom sempre levar um pouco de fumo e colocar nas raízes do mangue. Para alguns, o Guajará apresenta certa semelhança com o Saci e com o Caipora, duendes dos matos, apreciando-se, sobretudo, o espírito travesso, buliçoso, às vezes malévolo, com atitudes de assombramento. Para outros, como seu José de Fátima diretor do Museu de Itarema e guardião da memória, o Pai do Mangue (Guajará) se mostra como um velho de cabelos e barbas longas, vestido com roupas velhas e rasgadas, pés descalços e com um cachimbo na mão.
Há muito tempo atrás em Almofala, uma velha índia Tremembé chamada Tia Chica relatou o seguinte, “O Guajará mora nos mangues... uma vez eu estava pilando milho, quando senti a mão-de-pilão pesar na minha mão. Ai eu olhei pra fora e vi a sombra de um grande pássaro, me vi aperreada e gritei pela minha neta. Eu juro que aquele pássaro era o Guajará, em uma de suas costumeiras traquinagens”.


GUNOCÔ - Espírito Guardião das Florestas. Torna-se visível uma vez por ano, num bambuzal. Orixá da linhagem de Ogum que habita as florestas.

IARA - Senhora das Águas Doces. A Sereia Brasileira atende pelo nome de Iara e vive no fundo dos rios, à sombra das florestas virgens.
Conta a lenda amazônica que uma noite um índio sonhou com uma bela mulher de cabelos loiros, olhos azuis e pele muito clara. Tal fada estava à entrada de um imenso castelo de cristal recoberto de ouro e safiras de onde vinha uma música celestial. O jovem apaixonou-se à primeira vista e ouviu a linda mulher lhe propor amor eterno. Um dia navegando pelo rio, o índio viu formar-se sobre as águas uma choupana e, por detrás da janela, apareceu a mulher de seus sonhos que lhe sorria. Apaixonado e enfeitiçado foi até a choupana que flutuava sobre as águas. O pai do índio pode ver que o corpo da mulher tinha uma cauda, igual a de um peixe, e que, agarrando seu filho, se jogou na água, mergulhando para nunca mais voltar.

Alguns indígenas e caboclos juram já ter visto a Iara, como passou a ser chamada. em muitos rios e igarapés. A crença neste mito é tão grande, que, pelos lugares em que mora a Iara, segundo a tradição, ninguém tem coragem de passar em determinada hora da tarde. Em algumas ocasiões, comenta-se, ela mostra-se com pernas para logo em seguida transformar-se em sereia.
É nesta forma que atrai suas vítimas.
Para livrar-se do poder de sedução de Iara, aconselham os indígenas, deve-se comer muito alho ou esfregá-lo por todo o corpo.

Numerosas são as lendas em torno de Iara, seus encantamentos e artimanhas. É o mito que mais inspirou poetas brasileiros. José de Alencar, por exemplo, incluiu no romance "O Troco de Ipê" um conto sobre a mãe-d'água, em que figura um palácio de ouro e de brilhantes no fundo do mar.

O simbolismo mais conhecido da sereia é o da sedução mortal. Com toda certeza, ela é uma tentadora.
Mas a paixão inflamável que ela inspira é perigosa, porque provém do sonho e do inconsciente, e por isso é sonho insensato, fantasma irreal.

IPUPIARA - Um dos mais antigos mitos de nossa terra. Ser que reside nas fontes ou no fundo das águas, meio homem, meio peixe, meio animal, inimigo dos pescadores, dos garimpeiros e de todos os que tiram proveito das águas, mesmo as lavadeiras.
Entre vários relatos antigos, diz:
"parecem-se com homens propriamente, de boa estatura, mas têm os olhos muito encovados. As fêmeas parecem mulheres, têm cabelos compridos, e são formosas".
O modo que têm para matar é: abraçam-se com a pessoa, tão fortemente, beijando-a e apertando-a consigo, que a deixam feita toda em pedaços.
O Ipupiara brasileiro não tem nada a ver com os seres da água europeus como sereias; não há cantos melodiosos, palácios de cristal no fundo da água, encantadoras promessas de amor ou outro chamariz qualquer.
O Ipupiara era, segundo os cronistas "bestial, faminto, repugnante, de ferocidade primitiva e brutal".
Conta a lenda que em São Vicente, no ano de 1564, a linda escrava índia, Irecê ao ir à praia à noite, para um de seus encontros com o jovem Andirá, que vinha ao continente de canoa, deparou com um animal marinho gigantesco, com cerca de três metros de altura, com uma grande cabeça, bigode, braços longos, dentes pontiagudos e pés de barbatanas. Irecê encontrou a canoa de seu amado no mar, vazia. Esse animal, a princípio, foi descrito como sendo Curupira - o fantasma do mar, que foi morto pelo capitão Baltazar Ferreira assistente do capitão-mor, ao acudir o clamor de Irecê.
Os índios identificaram o animal como sendo o Ipupiara, o demônio da água.
Diziam que ele habitava o espaço entre a velha "Casa de Pedra" (primeira construção de alvenaria do Brasil) e a Praia de São Vicente (Gonzaguinha). O fato, misto de horror e fantasia, teria sido comentado por todo o Brasil e até por estrangeiros de vários paises. Entretanto, ninguém jamais falou da única vítima presumível do Ipupiara o vicentino Andirá, que deixou para trás sua canoa solitária à beira mar e o coração partido de Irecê. Como toda lenda, a do Ipupiara parte de algumas premissas verdadeiras. Estudiosos e historiadores entendem que o tal monstro não passava de um leão marinho, desviado pelas águas frias do inverno que, desavisado, veio parar nas praias brasileiras.

JACI - Deusa-Lua, irmã-esposa do Sol. Protetora da vida vegetal é mãe de todos os frutos.
Tem duas formas: Iaci Omunhã (Lua Nova) e Iaci Icaua (Lua Cheia).
As tradições sobre a Lua, no Brasil, provêm de portugueses, negros e indígenas. Eram devotos da Lua muitos dos índios brasileiros mais arredios, como os cariris, que se alegravam quando viam a lua nova, por lhes trazer augúrios e novidades.
Na teogonia ou mitologia dos índios do Brasil, Jaci era a Lua, irmã e ao mesmo tempo esposa do Sol, Coaraci.
Seu nome em língua tupi combinava os elementos já, "fruto", e ci, "mãe".
Assim, presidia a vida vegetal e o crescimento.
Era a "mãe dos frutos" e, ainda hoje, muitas tribos indígenas organizam grandes festividades em sua homenagem.

Na lua nova, cantam, dançam e bebem durante toda a noite para festejar Jaci Omunhã. Contam o tempo pelo ciclo lunar e repetem os festejos também na lua cheia - a que dão o nome de Jaci Icauá.
Os índios acreditavam que Jaci controlava os gênios das florestas, como o saci-pererê, o boitatá e o curupira. Era simbolizada com um ornato feito de concha branca talhada em forma de crescente.

JURUPARI - Senhor das Leis é filho virginal de Ceuci. Não podia ser visto por nenhuma mulher; aquela que o visse, morria. Jurupari foi o herói mítico criado pelos homens para explicar e justificar as duras leis aplicadas às mulheres, que ficaram relegadas a uma total situação de inferioridade.

Ele veio do céu e é o Coaraci Raia, o Filho do Sol, um equivalente ao "filho do Deus Sol", cuja intervenção se faz de forma direta às mulheres, retirando-lhes todo o poder.
A realização da grande Festa do Jurupari, onde não era permitida a participação feminina, foi uma das maiores causas para agravar as diferenças nas relações entre homens e mulheres. O objetivo da festa não era outro senão intimidar e despertar uma atitude mais passiva e submissa do mulherio, para maior tranqüilidade dos homens.

Existe uma lenda que diz assim:

“No princípio, após a morte do filho da virgem, eram as mulheres que tocavam paxiúba (instrumentos de sopro) e vestiam as máscaras. Mas este tinha, sem dúvida, as suas razões para não amar as mulheres. Um dia desceu do céu e perseguiu uma delas, que tinha a máscara e as paxiúbas. Ela parou para urinar e depois se lavar. Jurupari afinal à alcançou. Deitou-a sobre a pedra, violou-a e tirou-lhe as paxiúbas e a mácara. Desde esta época, as mulheres não devem ver as máscaras, sob pena de morte, e Jurupari instituiu definitivamente a Casa dos Homens e a Festa dos Homens."

As Amazonas seriam então, um resquício vivo, da rebelião das mulheres, que não submeteram a nova ordem social imposta herói mítico Jurupari, que introduzia o predomínio do homem sobre a mulher.

Portanto, podemos afirmar, que na Amazônia, em tempos ainda não totalmente determinados, imperava o matriarcado, mas as mulheres acabaram perdendo seu poder e Jurupari instituiu novas leis. Não conformadas com tais ditames, por diversas vezes deve ter havido a tentativa de retomada desse poder. Como não foi alcançado o objetivo e em vista da forte repressão feita pelos homens, fugiram e foram construir tribos onde viviam sós.

As tentativas dos homens de dominar tais comunidades, por certo devem ter ocorrido. Daí a belicosidade das mulheres, que estabeleceram um grande poder para se defenderem.

É interessante acrescentar, que mesmo na lenda de Jurupari, ainda se conservava a predominância da natureza feminina, pois a palavra Coaraci, segundo Barbosa Rodrigues é de significado feminino:

a) CO = verbo ser
b) ARA = o dia
c) CI = mãe, de onde.

COARACI, que dizer "MÃE DO DIA", atestando a proeminência feminina frente a radical mudança de costumes...


A Lenda
O Jurupari é um personagem que aparece em inúmeras lendas amazônicas. Em algumas histórias é retratado como um herói que trouxe ordem ao mundo, em outras aparece como um temível demônio. Às vezes chamado de "filho do Sol", outras vezes de "filho do Trovão". O fato é que Jurupari está presente na mitologia de diversos povos indígenas, notadamente os que vivem na região de fronteira entre Brasil e Colômbia. No começo do mundo, uma estranha epidemia atingiu os índios da Serra de Tenuiana. Morreram quase todos os homens. Sobreviveram as mulheres e alguns velhos. Para evitar a extinção daquele povo, um velho pajé - nascido da união de uma índia com o rei dos pássaros jacami - fecundou a todas as mulheres da aldeia com sua mágica. Depois disso ele mergulhou num lago onde uma estrela costumava se banhar, e desapareceu.
Dez luas depois, todas as mulheres deram à luz. Entre os recém-nascidos havia uma menina que foi chamada Ceuci.
Ceuci era de uma beleza esplendorosa. Já adolescente ela entrou na floresta e comeu a fruta proibida do pihican. O suco delicioso da fruta escorreu da boca de Ceuci, desceu por seu corpo e banhou-lhe as partes mais recônditas. Após comer as frutas sentiu-se diferente. Examinou-se e viu que não era mais virgem. Estava grávida.
Dez luas depois nasceu um menino forte e belo, que se parecia com o Sol. Foi batizado com o nome de Jurupari.
Os índios elegeram a criança como seu líder. Naquela época eram as mulheres que governavam. Elas discutiam a melhor hora para entregar os símbolos de chefe a Jurupari e quando se deu conta, a criança havia sumido.
Procuraram por Jurupari, mas nada encontraram. Dos mais altos morros da serra ouvia-se murmúrios de criança. A infeliz Ceuci permaneceu na mais alta montanha, chorando a perda de seu filho. À noite ela dormia e ao acordar pela manhã sentia que seus seios estavam vazios. Era Jurupari que vinha junto dela se amamentar.
Depois de 15 anos, Jurupari voltou a sua aldeia.
Ele revelou a todos que recebera uma missão do Sol: reformar os usos e costumes dos povos da terra. Ele ferveu uma resina em uma panela com água e criou todos os pássaros que voam pelo céu. Recebeu os enfeites de chefe, ensinou as novas leis a seu povo e mandou que alguns homens fossem às aldeias vizinhas, espalhar as novas leis a outros índios.
Jurupari carregava consigo uma bolsa que lhe foi entregue pelo próprio Sol. De dentro da bolsa, Jurupari retirava pedras que eram pintadas com as sombras do céu, e que mostravam tudo o que acontecia pelo mundo. Nessas pedras, Jurupari também podia ver o futuro.
Em uma dessas pedras, Jurupari viu a morte de Ualri. Ele se transportou até a palmeira passiua que havia nascido do corpo de seu enviado. Uma música saía da palmeira quando o vento assoprava. Jurupari pediu às aves que cortassem as folhas da árvore, e usando a mandíbula de um peixe serrou a palmeira, que na verdade eram os ossos de Ualri.
Daquela palmeira, Jurupari construiu um conjunto de flautas sagradas para que fossem utilizadas nos rituais a partir dali. Cada uma das flautas foi batizada com um nome da língua dos diversos povos que viviam no local. E cada flauta possuía um significado. A seguir estão algumas da flautas construídas por Jurupari:

- O instrumento principal tinha a altura de Jurupari e foi chamado Ualri, cuja história já foi contada.

- A flauta Tintabri (nome de uma ave, em uaupés) tinha o tamanho de um braço. Sua história é a de uma mulher muito bonita, mas que era tão vaidosa que foi transformada nessa ave pelo chefe de sua aldeia.

- A flauta Mocino (grilo, no idioma arapazo) tinha o tamanho da coxa de Jurupari. Ela representa a sombra de um homem-mulher que, por não querer amar ninguém viveu sempre escondido cantando apenas de noite. Foi transformado em grilo pela própria mãe da noite.

- A flauta Arandi (arara na língua pira-tapuia) tinha o tamanho de dois braços. Representa uma mulher bonita, mas que não gostava de homens. Foi transformada em arara.

- A flauta Piron (águia, no dialeto Jurupixuna) tinha a largura de três mãos. Representa o pajé, que ganhou da águia as pedras em que via tudo pela imaginação.

- A flauta Titi (paca, na língua Baniwa) do tamanho da medida dos joelhos à cabeça. Representa uma velha que vivia roubando e foi transformada em paca por um esquilo.

- A flauta Canaroarro (saúva, na língua manau) do tamanho da medida dos ombros até o umbigo. Representa um velho que viu em sonho a fome comendo a Terra, e que passou a vida acumulando provisões dentro de casa para quando viesse a fome. Foi transformado em formiga pelo tatu.

deusa ancia

KERPIMANHA - Deusa-Anciã, Senhora dos Sonhos, que desce do céu, pelo caminho do Arco-Íris (durante o dia) ou pelos raios das estrelas (durante
à noite) e entra no coração das pessoas enquanto dormem e só sai de lá depois que elas acordam.
Assim, quando uma pessoa acorda, encontra em seu coração o recado de Tupana, que a Velha deixou.
Contam os tupis que junto a Tupã, o deus dos deuses, capaz de dominar os raios e os trovões, morava uma deusa-anciã, chamada Kerpimanha.
A velha senhora, dona dos sonhos, desce do céu pelo caminho do arco-íris para trazer os sonhos que sonhamos, por vezes acordados durante o dia, e pelos raios da estrelas os que sonhamos durante a noite, em repouso.
Com um sopro de vida ela entra nos corações das pessoas e só sai de lá quando elas despertam, assim quando uma pessoa se lembra do seu sonho encontra o recado de Tupã que a velha deixou gravado no seu coração.

KILAINO - Duende dos bacaeris, variante do Caipora. Este espírito da Natureza é representado por um negrinho de uma só perna que fuma cachimbo e usa um barrete vermelho que lhe dá os poderes milagrosos. Às vezes transforma-se numa lindíssima mulher ou em diferentes pássaros e assinala a sua presença por um assobio com o qual assombra os humanos e que ninguém consegue localizar. Persegue os cavalos durante a noite e depois lhes entrança as crinas. Este espírito em vez de ajudar na casa é o responsável por uma série de tropelias que incluem a ocultação de objetos e o estrago de alimentos. Segundo a tradição, este espírito traquina paga muito ouro para reaver o seu barrete caso este lhe seja roubado pelos humanos. este espírito da natureza é o Saci, também chamado de Saci-Pererê, Kilaino, duende dos bacaeris, índios caraíbas de Mato Grosso Caipora ou Curupira.

MANI - Espírito da Mandioca.
Às vezes assume a forma de uma menina e passeia pelas plantações. Em tempos idos, apareceu grávida a filha dum chefe selvagem, que residia nas imediações do lugar em que está a cidade de Santarém, Pará. O chefe quis punir no autor da desonra de sua filha a ofensa que sofrera seu orgulho e, para saber quem ele era, empregou debalde rogos, ameaças e por fim castigos severos. Tanto diante dos rogos como diante dos castigos a moça permaneceu inflexível, dizendo que nunca tinha tido relação com homem algum.
O chefe tinha deliberado matá-la, quando lhe apareceu em sonho um homem branco, que lhe disse que não matasse a moça, porque ela efetivamente era inocente, e não tinha tido relação com homem.
Passados os nove meses, ela deu à luz uma menina lindíssima e branca, causando este último fato a surpresa não só da tribo como das nações vizinhas, que vieram visitar a criança, para ver aquela nova e desconhecida raça.
A criança, que teve o nome de Mani e que andava e falava precocemente, morreu ao cabo de um ano, sem ter adoecido e sem dar mostras de dor. Foi ela enterrada dentro da própria casa, descobrindo-se e regando-se diariamente a sepultura, segundo o costume do povo.
Ao cabo de algum tempo, brotou da cova uma planta que, por ser inteiramente desconhecida, deixaram de arrancar. Cresceu, floresceu e deu frutos.
Os pássaros que comeram os frutos se embriagaram, e este fenômeno, desconhecido dos índios, aumentou-lhes a superstição pela planta. A terra afinal fendeu-se, cavaram-na e julgaram reconhecer, no fruto que encontraram, o corpo de Mani. Comeram-no e assim aprenderam a usar a mandioca.

MAPINGUARI - Gênio em forma de homem, mas todo cabeludo. Seus grandes pêlos o tornam invulnerável à bala, exceto na região do umbigo.
Uma das características mais marcantes do Mapinguari é o odor insuportável que ele exala na mata. Os caboclos o descrevem como um bicho semelhante a um homem com o corpo coberto de pêlos, como um grande macaco, e com apenas um olho bem no meio da testa. Dizem também que a boca do Mapinguari é algo descomunal; tão grande que não termina no queixo, como a dos homens, mas na barriga. A pele dessa figura mitológica é descrita como parecida ao couro dos jacarés e ele tem nas costas uma espécie de armadura que se parece com um casco de tartaruga.


Ao contrário das outras visagens, o Mapinguari ataca mais durante o dia do que à noite. E há também os que dizem que o Mapinguari só aparece em dias santos.


Dentro da mata, é fácil perceber o rastro de um Mapinguari: os arbustos ficam quebrados e o mato todo esmagado.
Ao correr no meio da mata o Mapinguari solta gritos, da mesma forma como os caçadores fazem para se comunicarem uns com os outros. Ele faz isso para atrair a atenção dos caçadores e poder devorá-los com sua boca imensa. E dizem que começa pela cabeça da vítima!

MBOIA-AÇU - Espírito do Rio Solimões, tem a forma de uma cobra gigante com olhos de fogo. Animal fabuloso do rio Solimões, Amazonas, cobra gigantesca, com poderes mágicos. É uma variante local de Cobra-Grande, a Mboia-Açu. É uma tapuia encantada em uma cobra. Vejamos: a filha de um pajé deitou-se levar pelo amor de um emigrante, concebendo dois filhos gêmeos: José e Maria.
Quando o velho pajé soube do caso, calou-se e, quando as crianças nasceram, matou a filha e atirou-as na água, morrendo José; Maria foi protegida da Iara e hoje faz tudo quanto quer; é muita coisa na água. Aparece sempre à noite. Os seus olhos são como os de Anhangá, duas tochas de fogo. Não tem ouvido falar numa cobra enorme, que derruba barrancos, afunda canoas, encalha navios e tem feito muitos valentes agonizar de fraqueza?


MBUÁ - Deus da Caça, protetor dos filhotes e das fêmeas. Antes de começar uma caçada, deve-se oferecer um beiju para Mbuá em troca do animal.

MOTUCU - Espírito da Floresta, variante do Curupira. Entidade misteriosa e malévola dos indígenas Manaus, aruacos do rio Negro, Amazonas. OMotucu vive nas florestas e tem os pés virados como o curupira ou o matuiú.
“Uma das principais fábulas provindas dos Manaus é a do Motucu, ou demônio dos pés virados, cujas perenes jornadas fazia-se por intermináveis atalhos, incendiando floresta e deixando após si rochas estéreis”.

NIBETAD - Herói mitológico que vive nas Plêiades. Um dia desceu e casou-se com uma mulher da tribo dos Cadiuéu; dessa união nasceram dois filhos: Gawé-txéheg e Nõmileka, grandes pajés.

PORONOMINARE - Herói mitológico da Bacia do Rio Negro. O primeiro humano criado, fundador das civilizações.

RUDÁ - Deus do Amor (Tupi), encarregado de promover a reprodução de todos os seres vivos. Tem a aparência de um guerreiro e vive nas nuvens,
com duas ajudantes: Cairé (a Lua Cheia) e Catiti (a Lua Nova). Essas duas tinham a missão de despertar saudades nos amantes ausentes. Representa a busca pela completude e recebe os pedidos de conquista e fidelidade amorosa, em um estilo de vida em harmonia com a natureza. A forma de nossos anéis e pingentes vem dessa simbologia.
Rudá é o nome dado à combinação de madeiras nobres e pedras em seu estado natural. O tempo, essencial ao amadurecimento das madeiras, é também o artista que exculpe e colore as pedras. As formas orgânicas evidenciam o respeito a esse processo, orquestrado pela natureza.

TATÁ-MANHA - Deusa do Fogo.

TUPÃ - Também chamado de TUPANA é o Deus dos Raios e Trovões, mas às vezes também é conhecido como Mãe do Trovão.
Em uma aldeia dos índios Maués havia um casal, com um único filho, muito bom, alegre e saudável. Era muito querido por todos de sua aldeia, o que levava a crer que no futuro seria um grande chefe guerreiro. Isto fez com que Jurupari, o Deus do mal, sentisse muita inveja do menino. Por isso resolveu matá-lo. Então, Jurupari transformou-se em uma enorme serpente e, enquanto o indiozinho estava distraído, colhendo frutinhas na floresta, ela atacou e matou a pobre criança. Seus pais, que de nada desconfiavam, esperaram em vão pela volta do indiozinho, até que o sol foi embora. Veio a noite e a lua começou a brilhar no céu, iluminando toda a floresta. Seus pais já estavam desesperados com a demora do menino. Então toda a tribo se reuniu para procurá-lo. Quando o encontraram morto na floresta, uma grande tristeza tomou conta da tribo. Ninguém conseguia conter as lágrimas. Neste exato momento uma grande tempestade caiu sobre a floresta e um raio veio atingir bem perto do corpo do menino. Todos ficaram muito assustados.
A índia-mãe disse: “... É Tupã que se compadece de nós. Quer que enterremos os olhos de meu filho, para que nasça uma fruteira, que será nossa felicidade".


Assim foi feito. Os índios plantaram os olhinhos da criança imediatamente, conforme o desejo de Tupã, o rei do trovão. Alguns dias se passaram e no local nasceu uma plantinha que os índios ainda não conheciam. Era o Guaranazeiro. É por isso que os frutos do guaraná são sementes negras rodeadas por uma película branca, muito semelhante a um olho humano.
No início de todas as coisas, Tupã criou o infinito cheio de beleza e perfeição. Povoou de seres luminosos o vasto céu e as alturas celestes, onde está seu reino. Criou então, a formosa deusa Jaci, a Lua, para ser a Rainha da Noite e trazer suavidade e encanto para a vida dos homens. Mais tarde, ele mesmo sucumbe ao seu feitiço e a toma como esposa. Jaci era irmã de Iara, a deusa dos lagos serenos.
Criou ainda, o forte deus Guaraci, deus do Sol, irmão de Jaci, o qual dá vida a todas as criaturas e preside o Dia.
Fez nascer também Icatú, o belo deus. Formou um lugar de delícias para os bons e um lugar tenebroso para os maus. Neste lugar vagam as almas sem vida e os espíritos dos guerreiros sem glórias ou fugidos das tribos. Tupã, após uma batalha, lançou para este lugar sombrio, seu temível e poderoso inimigo Anhangá. deus dos Infernos, chamando estes lugares de regiões infernais. Juntamente com este impiedoso deus, à este mundo subterrâneo também forma dirigida: o jurupari que ficou conhecido como mensageiro deste deus cruel; Tice, que se tornou esposa do deus das trevas; Xandoré (ave falconídea), o deus do ódio; Caramuru e o Boto; Abaçaí e Guandiro e muitos angás. Este era o reino do pavor, do ódio, da dor e da vingança.
No alto dos céus, sentado em seu trono, Tupã criou milhares de criaturas celestes que executavam suas ordens e o louvavam. Fez nascer sobre os verdejantes mares os Sete Espíritos e os gênios que sob as ordens do Boto deus dos abismos dos mares, governavam os oceanos e habitavam na sagrada Loca, que é a habitação dos deuses marinhos no fundo das águas.
Criou Pirarucú, deus do mal e deu vida ao alegre Curupira, deus protetor das florestas. Do mesmo modo, nasceram as Sete Deusas: Guaipira, a deusa da história;
Pice a deusa da poesia;
Biaça, a deusa da astronomia;
Açutí, a deusa da escrita;
Arapé, a deusa da dança;
Graçaí, a deusa da eloqüência;
e Piná. a deusa da simpatia.

Depois criou para a alimentação dos deuses, o divino Ticuanga, o bolo feito de massa de óleos e outras iguarias deliciosas para alimentar e deleitar os imortais. Mandou em seguida, preparar o sagrado Tapicurí, o vinho dos sacros deuses e Tamaquaré, a fina essência aromática usada pelos Senhores da Eternidade. Estabeleceu as horas, os minutos e os segundos. Fixou as estações e as mutações. Deu uma forma estável e regular ao Universo e instituiu o Nadir e o Zênite. Fez nascer a reciprocidade e criou:

Catú, o deus outonal,
Mutin, o deus da primavera,
Peurê, o senhor do verão
e Nhará, que preside o inverno.

Criou também Tainacam, a deusa das constelações. Igualmente deu vida as Tiriricas, as deusas da raiva, do ódio e da vingança. Colocou nas densas florestas o Caapora, deus vingativo, protetor das casas e dos animais e lhe deu o feroz porco caitetú, sobre o qual cavalgava o temido deus, protegendo os filhotes dos animais. Criou Aruanã, o deus da alegria e protetor dos Carajás e faz germinar no norte do Brasil as ricas e belas carnaubeiras, chamadas de árvores da vida.
Para concluir sua obra, Tupã veio ao mundo e fez o homem e deu-lhe como companheira a mulher e logo eles se multiplicaram e encheram toda a terra. O poderoso deus tomou então das suas criaturas e ensinou-lhes a arte de tirar do seio da terra, ricos legumes e frutas, trabalhar com barro e argila e do férreo Ubiratã, fazerem as mais fortes lanças e armas de guerra. Depois transmitiu aos homens todo o conhecimento sobre os remédios para todas as doenças. Finalmente, ensinou-lhes a arte que tornam a vida mais suave a amena. Abençoou o sagrado Ibiapaba, Monte Sagrado dos Deuses Brasileiros e nele permitiu a permanência das Parajás, do bondoso Inoquiué, das Parés, de Solfã e de outros deuses imortais. Até ele próprio lá comparecia, vez por outra.

Alegres viviam os homens, felizes cresciam as crianças. Todos os deuses gloriosos e imortais amavam-nos e davam-lhes formosos e ricos rebanhos de capivaras, pacas e cabras. Ao morrerem, os homens não sofriam, pois mergulhavam em doce sono, seus corpos voltavam à terra e suas almas subiam aos céus. A vida proporcionava todo o bem imaginável. A terra era fértil e produzia-lhes todas as árvores frutíferas que precisavam. Se algum mortal faltava com a veneração dos imortais, entretanto, era duramente castigado. Os deuses reuniam-se em assembléia no Monte Ibiapaba e enviavam as mensagens aos homens pelo alegre Curupira, o qual, possui os calcanhares para diante, os dedos para traz e habita as florestas, castigando todo aquele a destrói ou incendeia e é mais célebre do que Polo, o deus do vento.

Mas, eis que um dia, Anhangá, cheio de inveja, transformado numa bela e astuta jararaca gigante, soprou no ouvido dos homens a maldade e ainda que os outros deuses protetores vagassem em torno deles para ajudá-los, nada conseguiram. Então começaram os homens a serem dominadas por grande ambição e as Parajás, deusas do bem, da honra e da justiça, que eram inseparáveis, envolveram o corpo com brancas plumas e abandonaram os mortais, voltando para junto dos deuses eternos e a escura deusa Sumá (deusa inimiga dos homens), envolvida em negra manta, feita de cipó chumbo, vagou pela terra, espalhando ódio e discórdia. Deste modo os maus sentimentos ganharam o mundo e os mortais tiveram o conhecimento do mal, da injustiça e amaram mais a maldade do que as belas virtudes.

No alto dos céus, com os outros deuses, Tupã dominava, desde o começo dos tempos e numa grande batalha, vencera o cruel deus Anhangá, senhor dos infernos e seu irmão, o deus Xandoré.

Com o seu poder, Tupã aprisionou o deus do ódio na sagrada serra do Ibiapaba. Algum tempo depois, ele foi solto por Jururá-Açu a bela imortal. Por castigo, Tupã, fez nascer nas costas desta deusa uma espécie de concha, e cobriu-lhe o corpo todo como uma cor amarelada e Jururá-Açu transformaram-se na feia e horrível tartaruga que habita as águas doces dos rios. Assim, pode Tupã se gloriar de ter vencido todos os que se opunham à ele.

Mas agora Tupã arrependeu-se de ter criado os homens! Voltou ele então à Ibiapaba e se reuniu em assembléia com os imortais. Depois de muita discussão, chegaram à um consenso que deveriam destruir a terra e todos os homens.

Já Caramurú, deus que presidia as faíscas e as ondas revoltas dos grandes oceanos, por ordem do Conselho Divino, queria derramar sobre a terra os seus raios e curiscos, mas o deus do trovão decidiu que a terra deveria ser engolida pelas águas da chuva.

Desta forma, Polo aprisionou os ventos na forte e gigante palmeira ubuçú, mo Monte Araçatuba. Boto desceu à terra, convocou todos os grandes e pequenos rios e Iara, raivosa, ordenou as fontes e as chuvas que caíssem abundantemente durante quarenta dias e noites, sem cessar.

Os Sete Espíritos dos grandes oceanos por ordem do Boto atiraram para a terra seca, bravias ondas dos mares e fortes aguaceiros despencaram dos céus. As janelas celestes se abriram e as plantações dos Tupis quedaram-se sob o peso das águas e da tempestade. As águas invadiram toda a terra levando com elas as ocas, as tabas, as árvores e os templos. Os animais se debatiam nas ondas. Tribos numerosas eram engolidas pela inundação e os que escapavam das águas, morriam nas alturas dos montes por determinação de Tupã.
Quando Tupã olhou para a terra, viu o mundo submerso em águas mortas e apenas um casal de homens reverentes para com os eternos, contemplava os céus: Açu e Pirá. Neste instante o senhor dos mundos, fez baixar as águas e surgiram novamente as montanhas, a planície e a terra seca.

Açu olhou a sua volta e viu tudo mergulhado no silêncio da morte. As lágrimas começaram a molhar sua face, quando perguntou a Pirá:
- Somente nós não sucumbimos no cataclismo, o que faremos sós e abandonados nesta imensidão?
Os dois suplicaram entre salgadas lágrimas que a meiga e doce deusa Caupé para que os ajudassem a recuperar toda a geração morta Ouvindo tais súplicas a deusa desceu e falou-lhes:
- Olhai três vezes para os céus e dizei: descobrimo-nos perante vós deuses imortais curvam as nossas cabeças perante vossas ordens. Depois, tomai grande porção de areia e atirai para o alto.
Não hesitando um só momento em executar os tais ensinamentos da deusa e mal atiraram os grãos de areia, viram que deles surgiram imagens, formas humanas. E, desse modo, com o auxílio divino, nasceram milhares de homens e mulheres e essa geração humana vindo de um só ramo Tupi, encheu todo o lendário Brasil.

Depois de algum tempo, Açú e Pirá tiveram um filho, Tujubá, o ascendente dos tupinambás. Os filhos deste foram: Arumã, o herói, Moema, Taparica, que foi pai de Paraguassú, Irapuã, Tibiriçá que foi pai de Bartira, esposa do Guaraciaba (João Ramalho), fundador de Piratininga, Tamará, Jucuré o semimortal, Icundi, e o belo Gunzá, Araribóia, o valente, Taparica, o invencível, Paumá, o navegador, Inhampuambuçu, o vingativo, Poti, o guerreiro e Mendicapuba e a formosa Agniná


UAUIARÁ - Deus das Águas (AM), protetor dos peixes. Tem a forma de um boto e, às vezes, se transforma num lindo rapaz, no início das noites de Lua Cheia, para seduzir as moças ribeirinhas. Tem que voltar para a água antes do nascer do sol. Também pode assumir a forma de uma bela mulher, com os cabelos até os joelhos, para atrair os rapazes. Às vezes assume a forma de um cão robusto. Seu nome significa "o que chega de repente".
Em um universo fantástico e telúrico, onde forças primitivas e inimagináveis para o vulgo ainda predominam, lendas, crendices, histórias fabulosas de deuses, homens e animais são tão reais quanto os infindáveis rios e a vida ensolarada, e habitam a mesma dimensão mágica. No paraíso amazônico onde tudo é possível, ou quase tudo, o mito do boto, o príncipe encantado das águas, assume uma feição especial, pois integra, ao mesmo tempo, o onírico e o concreto. Do imaginário para o real, os "filhos de boto" estão aí, pelos beirados, a perpetuar uma raça mística, na qual não há distinção entre homens e deuses.

O boto, mamífero de águas doces, é um cetáceo delfinídeo do gênero Sotália, parente do golfinho chinês e indiano que, desde a antiguidade clássica, tem sido considerado um símbolo lúbrico, um fetiche ictiofálico dedicado a Vênus ou Afrodite, deusa do amor. A razão disso é a analogia existente entre as qualidades protetoras e sensuais do boto tucuxi amazônico e aquele atribuído ao delfim consagrado a Afrodite, a deusa nascida do mar e protetora dos amantes.

O golfinho, ou delfim é também associado a Apolo, o deus da beleza, cuja associação resultou no nome de Delfos ao seu famoso santuário na Grécia. Além disso, uma tradição chilena, ainda hoje, conta a história dos peixes que foram os seres humanos pré-diluvianos, os quais, de tempos em tempos, saem dos rios e vêm procriar com as mulheres. Em muitos mitos, por sinal, em várias partes do mundo, sempre houve referências à fecundação por deuses e entes mágicos.

Segundo o historiador Câmara Cascudo, alguns cronistas relataram histórias do boto como sendo a personificação do Uauiará, ou Uiara (Senhor das Águas), o grande amante das mulheres caboclas e índias na mitologia tupi. O primeiro filho de muitas nativas é atribuído ao contato com esse deus que, ora as surpreende no banho, ora transforma-se em mortal para seduzí-las, arrebatando-as para dentro das águas. O boto, como Uauiará, representa o variante masculino da Iara (Mãe-d'Água), dona de igual poder de encantamento e sedução.

Assim, de modo amplo, o peixe está simbolizando o elemento água, dentro da qual vive. Ele transforma-se em homem e atinge o estado de manifestação dos poderes secretos, trazidos das profundezas do seu elemento. O peixe também é símbolo da vida e da fecundidade, em vista da sua prodigiosa faculdade de reprodução e do número infinito dos seus ovos.

Para quem conhece a Amazônia, não causa espanto que a psique dos habitantes, principalmente a feminina, possa fazer nascer dos imensos rios uma figura de animus. A presença das águas determina toda a vida da região, um verdadeiro planeta aquático, na forma das correntes fluviais, enchentes, chuvas torrenciais ("torós"), enxurradas, ou fenômenos incríveis como as "pororocas". A comunhão da mulher com a natureza é tão intensa, que um estrato de sua psique pode facilmente projetar-se nas águas e esperar dali a vinda do amante sensual.

Consta que o órgão sexual do boto, tanto do macho quanto da fêmea, é idêntico aos órgãos sexuais feminino e masculinos. A semelhança entre os órgãos genitais humanos e dos botos torna verossímil a experiência sexual que o folclore insistentemente relata e, certamente, tem contribuído para intensificar o simbolismo do mito.

Antes da popularização do boto "amoroso", no entanto, relatam as lendas indígenas que havia um outro boto sério e bom, venerado pelos tapuias como um deus milagroso, conhecido como Mira que quer dizer boto-gente, ou boto em forma de pessoa. Essa sacralização contribuiu para que o consumo de carne de boto se tornasse um tabu, o que faz com que, na região, dificilmente índio ou caboclo se atreva a comer carne de boto. Possivelmente o eco desses atributos de bondade com relação ao boto perduram, pois, de acordo a maiorias das tradições, ao boto é atribuída geralmente uma função protetora, havendo relatos de que o boto ampara as canoas em temporais e acompanha embarcações em que viajam mulheres grávidas, cuidando de protegê-las até que cheguem em terra firme.

O fato é que, cercado de crendices e lendas, o boto amazônico, ou "boto-namorador", é um dos animais mais populares da região, e suas atividades "donjuanescas" têm sido noticiadas em crônicas brasileiras e portuguesas há pelo menos dois séculos. Em forma de homem, pela qual é mais conhecido, apaixona e rapta as cunhãs, conquistando-as nos bailes e nas beiras de rio. Ocasionalmente em forma de mulher, "vira a cabeça" dos caboclos, deixando-os apalermados. Diz-se que, depois de servir sexualmente ao caboclo, o boto fêmea se apega a ele e passa a rondar a sua cabana ribeirinha e a proteger a sua canoa dos perigos das águas. Outros dizem, ao contrário, que o homem tem relações com o boto fêmea, ou bota, no linguajar caboclo, morre exausto, em razão do coito arrebatador.

Apesar das variações, o mito possui um conteúdo predominante, que se refere à entrega sexual da cabocla a um ser mágico. Este ser é visto como uma transformação do boto em rapaz sedutor que arrebata a jovem com carinhos e doces palavras e a possui nas praias mornas dos rios, em meio à natureza inebriante e acolhedora. No lendário amazônico, é natural atribuir ao boto a paternidade de um bebê inesperado. E o boto-namorador que infelicita as famílias ao seduzir donzelas, casadas ou viúvas, é descrito como um belo e elegante rapaz que usa sempre impecáveis roupas brancas e chapéu preto, fala manso, e, dizem, toca bandolim. A deslumbrante figura aparece nas noites enluaradas, na ribeira dos rios, nos bailes e nos barrancos, e deixa sua marca nas areias das praias e no corpo das mulheres, geralmente na forma de um filho.

Dizem que uma mulher viciada em andar com o boto emagrece, empalidece, fica de tal forma enredada nas malhas do sedutor, que tem que ser levada a um curandeiro para ser liberta do encanto. Nas localidades interioranas, é comum a recomendação de que as mulheres não andem de canoa, não transitem pelos beiradões quando estiverem menstruadas, e evitem o uso de vestidos vermelhos, pois esta cor agrada ao boto e pode atraí-lo.

O caráter erótico e afetivo do mito do boto guarda estreita relação com temperamento sensual do habitante nativo da região que, inclusive, utiliza as partes do animal para fazer amuletos. O olho de boto, assim como os órgãos sexuais do boto fêmea, são muito requisitados por curandeiros e feiticeiros, e tidos como matéria-prima de amuletos de incrível eficácia em casos amorosos. Enfim, este ente saído do mundo interior, o mundo que no mito está simbolizando pelas águas dos rios e mares, tem o poder de suplantar a realidade consciente porque faz parte de um mundo mágico e telúrico, que foge à dimensão acanhada do mundo real e no qual ainda é possível viver o sonho e ser feliz.

URUTAU - Deusa-Lua, às vezes assume a forma de uma ave noturna, cujo canto melancólico e estranho, lembra uma gargalhada de dor.
Urutau, em tupi-guarani, significa ave-fantasma, já que durante o dia fica imóvel sobre um tronco, galho ou mourão de cerca, confundindo-se com a madeira, por causa de sua plumagem.


À noite, ecoa um canto melancólico, parecido com um lamento. Quando a lua nasce, tem um canto esquisito, parecido com "foi, foi, foi".
Por volta do ano de 1996 ouvia-se na cidade de Guarantã o canto de um Urutau. Algumas pessoas diziam ter visto este pássaro em um pé de nêspera que se encontrava ao fundo da casa da agricultura. Ele sempre cantava por volta da meia noite. Ouviram o canto desse pássaro durante alguns meses e depois nunca mais foi encontrado ou ouvido por alguém na cidade.

XUNDARAUA - Espírito protetor do Peixe-Boi. Mata aqueles que pescam mais de um peixe-boi.
Para explicar a origem do Peixe-Boi os índios contavam uma lenda que dizia que em uma certa tribo indígena, habitante do vale do Rio Solimões, no Amazonas, foi realizada uma grande festa da moça nova e pela ação de Curumi.
O pajé mandou que a moça nova e o Curumi mergulhassem nas águas do rio. Quando mergulharam o pajé jogou, em cima de cada um deles, uma tala de canarana. Quando voltaram à tona já haviam se transformado em PEIXE-BOI.
A partir deste casal nasceram todos os outros peixes-boi. É por esse motivo que eles se alimentam de canarana.
O peixe-boi pertence à Ordem Sirênia e é o único mamífero aquático herbívoro. Ele vive na água, mas precisa vir à superfície em intervalos de 2 a 5 minutos para respirar. A espécie marinha (Trichechus manatus) pode medir 4 metros e pesar até 800 quilos! O peixe-boi amazônico (Trichechus inunguis) é menor: atinge 2,5 metros e pesa até 300 quilos. Além disso, ele é mais escuro e tem o couro liso. Uma outra diferença em relação a seu parente marinho é que o exemplar da Amazônia não tem unhas nas nadadeiras peitorais. É também o único dos sirênios exclusivo de água doce. O peixe-boi da Amazônia é uma espécie endêmica, ocorrendo apenas nos sistemas do rio Amazonas, no Brasil e do rio Orinoco, no Peru.


O peixe-boi é um animal de vida longa. Estudos revelam que o peixe-boi vive até 50 anos, podendo, em alguns casos, chegar a 60 anos. Ao longo do tempo, o homem tem sido, em grande parte, o responsável pelo encurtamento da vida desse animal. A caça indiscriminada fez do peixe-boi o mamífero aquático mais ameaçado de extinção no Brasil. Além da caça deliberada, outros fatores de extinção são a morte acidental em redes de pesca, o encalhe de filhotes órfãos e a degradação ambiental.

De acordo com a IUCN, International Union for the Conservation of the Nature, todas as espécies de sirênios ainda existentes correm riscos de extinção.


No Brasil, o peixe-boi é protegido por lei desde 1967 - Lei de Proteção à Fauna, No. 5197. A caça e a comercialização de produtos derivados do peixe-boi é crime pode levar o infrator a até 2 anos de prisão.
O Projeto Peixe-Boi foi criado em 1980 pelo Governo Federal, numa tentativa de fazer uma avaliação da situação em que se encontrava o peixe-boi marinho no Brasil. Em 1990, o Projeto recebeu o status de Centro Nacional de Conservação e Manejo de Sirênios, uma unidade descentralizada do Ibama - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Desde então, conta com o apoio técnico-administrativo da Fundação Mamíferos Marinhos, uma organização não governamental sem fins lucrativos que capta recursos para investimentos no Projeto Peixe-boi.
Em 1998, o Centro foi promovido a Centro Nacional de Pesquisa, Conservação e Manejo de Mamíferos Aquáticos, sempre atuando em parceria com a Fundação Mamíferos Marinhos na execução do Projeto Peixe-Boi.
Para reverter o processo de extinção do peixe-boi marinho, o Projeto Peixe-Boi, com a unidade móvel "Iguarakue" fez um extenso levantamento na costa brasileira, através de entrevistas direcionadas às populações ribeirinhas, definindo as principais áreas de ocorrência desse mamífero aquático, recomendando a criação de Áreas de Proteção Ambiental e a implementação de Bases Executoras Regionais.
Para cumprir sua função, o Projeto Peixe-Boi resgata, reabilita e reintroduz peixes-boi no seu habitat natural. A reprodução e o nascimento de filhotes em cativeiro também são elementos importantes desta estratégia. Existem exemplos vitoriosos de animais que passaram por este processo, foram reintroduzidos e hoje são monitorados diariamente pela equipe técnica do Projeto através da rádio-telemetria (ver Seu Amigo Peixe-Boi).